[ — Please scroll down for English version — ]
Resumo
Mais do que uma descrição da Cidade Universitária de Coimbra, edificada entre 1941 e 1975, Nuno Rosmaninho procurou promover, neste AzLab#49, um espaço de reflexão sobre uma obra paradigmática do Estado Novo, discutindo vários conceitos e, sobretudo, trazendo a azulejaria para o centro de um debate sobre “o lugar do azulejo nos discursos artísticos e ideológicos do Estado Novo”.
Explicando o que entende por arquitectura “classicista monumental totalitária” e “arquitectura moderna”, e aplicando os conceitos a este complexo arquitectónico, sem deixar de se referir à recepção crítica da obra, Rosmaninho abordou depois as diversas artes da Cidade Universitária. Destacou o sentido global das mesmas, no âmbito de um programa bem definido e com objectivos muito específicos, expressos numa iconografia que assenta em eixos fundamentais como a consagração da Universidade e da pátria, a sua dimensão universal ou ainda a própria ideia de Coimbra. O azulejo, como parte integrante deste conjunto, mereceu especial importância, com Rosmaninho a mostrar de que modo se articula com a arquitectura, adequando-se, na sua dimensão plástica, pictórica e cromática, às especificidades dos locais para o qual foi concebido.
Prosseguindo depois numa via mais centrada na azulejaria, Nuno Rosmaninho estabeleceu duas tipologias: as obras concebidas especificamente para locais precisos dos novos edifícios e o recurso a réplicas de exemplares dos séculos XVII e XVIII, para preencher lacunas em revestimentos mais extensos, num exercício de preservação e valorização do azulejo antigo de que é exemplo o Colégio de São Bento.
As duas obras de João Abel Manta mereceram uma análise mais detalhada, destacando-se o facto de os edifícios da Associação Académica e Teatro Gil Vicente, projectados pelo próprio João Abel Manta (n. 1928) e por Alberto José Pessoa (1919-1985), terem sido criteriosamente pensados para receber o painel de azulejos alusivo às actividades culturais e os vários painéis que retratam a evolução do trajo académico. Se os edifícios revelam uma ruptura formal com a Cidade Universitária, assumindo o que Rosmaninho definiu com uma “infiltração moderna”, os azulejos constituem também eles uma ruptura, até pelos temas representados, contemporâneos ou evolutivos, em vez de parados no tempo como o restante imaginário – apontam para a frente, enquanto a Cidade Universitária aponta para trás.
Todavia, o painel relativo às actividades culturais, que causou surpresa e desagrado, foi rejeitado pelas entidades competentes com o argumento de que subtraía o impacto da escadaria monumental, sendo por isso aplicado no jardim em que hoje ainda se encontra. Nesta medida, Nuno Rosmaninho concluiu a sua apresentação lançando um tema para debate: fará sentido reaplicar este painel de João Abel Manta no local para onde foi pensado originalmente? Até que ponto esta reposição da intenção original apaga a memória de uma tomada de posição do Estado Novo?
No debate que se seguiu, o público sugeriu que o próprio arquitecto fosse consultado sobre a matéria, sendo ainda discutida a falta de manutenção do jardim. Outras questões surgiram a seguir, destacando-se a discussão em torno dos conceitos de “moderno” e “modernista”, e o debate sobre a pertinência da sua clarificação, preocupação partilhada por alguns investigadores presentes.
____________________________________________________
THE AZULEJOS OF COIMBRA CAMPUS UNIVERSITY
Session overview
More than a description of Coimbra campus university, built between 1941 and 1975, in this AzLab#49, Nuno Rosmaninho sought to promote a reflection on a Estado Novo paradigmatic work, discussing various concepts and, above all, bringing the azulejos (tiles) to the center of a debate on “the place of azulejo in the artistic and ideological discourses of the Estado Novo.”
Explaining what he perceives as “totalitarian monumental classicist” architecture and “modern architecture”, and applying these concepts to this architectural complex, without leaving out the work’s critical reception, Rosmaninho then approached the various art forms of the campus university. He emphasized their overall meaning within a well-defined programme with very specific objectives, expressed in an iconography based on fundamental principles such as the consecration of the University and the country, its universal dimension or even the very idea of Coimbra. As an integral part of this set, the azulejo deserved special importance, with Rosmaninho showing how it is articulated with the architecture, adapting itself, in its plastic, pictorial and chromatic dimension, to the specificities of the places for which it was conceived.
Continuing later and focusing on the azulejos, Nuno Rosmaninho established two typologies: the works designed specifically for precise locations of the new buildings and the use of replicas from the 17th and 18th centuries, to fill gaps in more extensive coverings, in an exercise of preservation and appreciation of the old tile, as can be seen in the College of São Bento.
João Abel Manta’s two works deserved a more detailed analysis, highlighting the fact that the buildings of the Academic Association and Gil Vicente Theater, designed by João Abel Manta (b. 1928) and Alberto José Pessoa (1919-1985), had have been carefully thought out to receive the tile panel allusive to cultural activities and the various panels that portray the evolution of the academic garments. If the buildings reveal a formal break with the campus university, assuming what Rosmaninho defined as a “modern infiltration,” the tiles also constitute a rupture, even by the themes represented, contemporary or evolutionary, rather than stopped in time like the rest of the imaginary – they point ahead, while the Campus University points to the back.
However, the panel on cultural activities, which caused surprise and displeasure, was rejected by the competent authorities on the grounds that it subtracted the impact of the monumental staircase and was therefore applied in the garden where it is still today. To this extent, Nuno Rosmaninho concluded his presentation by launching a topic for debate: will it make sense to reapply this panel of João Abel Manta in the place where it was originally thought? To what extent does this restitution of the original intention erases the memory of the Estado Novo position?
In the following debate, the public proposed that the architect himself be consulted on the subject, and it was also discussed the garden’s lack of maintenance. Other issues emerged with a discussion on the concepts of “modern” and “modernist”, and the debate on the relevance of their clarification, a concern shared by some researchers present.