O AzLab dedicado ao tema Memórias, Fábricas & Mostruários, teve como convidados Francisco Queiroz e João Cortiço, e contou com a moderação de Patrícia Nóbrega. A sessão foi iniciada por Francisco Queiroz, que falou um pouco da história da Fábrica de Cerâmica de Santo António do Vale da Piedade e da Fábrica de Cerâmica das Devesas, ambas situadas em Vila Nova de Gaia/Porto, referindo-se ainda aos mostruários da Viúva Lamego. As primeiras apresentavam “mostruários aplicados” da sua produção de azulejos de padrão, tanto nos edifícios da própria unidade fabril, como nas lojas. Estes davam a conhecer aos clientes a variedade de padrões produzidos pelas fábricas, mas a aplicação de padrões em áreas de menor acesso e visibilidade mostra que este género de mostruários levanta ainda muitos problemas, começando pela própria definição de mostruário. A questão da salvaguarda do que resta das fábricas e, consequentemente, dos seus mostruários, foi outras das preocupações partilhadas, uma vez que o seu abandono e fácil acesso, assim como a difícil classificação dos edifícios subsistentes, facilitam o furto de azulejos dos seus interiores. Adiantando já o período de debate, o estado de conservação das fábricas de Gaia e a necessidade de salvaguarda das mesmas, foram preocupações expressas em diversas intervenções.
Por sua, João Cortiço apresentou a colecção Cortiço & Netos, que teve o seu início na década de 1970, com o negócio do seu avô, Joaquim José Cortiço, que adquiria restos de colecção a fábricas e a revendedores de azulejos. Com uma cronologia de produção que remonta à segunda metade do século XX, esta colecção testemunha a produção de dezenas de fábricas, contabilizando-se, pelo menos para já, mais de 900 padrões diferentes. Através da AIAI – Associação para a Interpretação do Azulejo Industrial -, exemplares de todos estes padrões são guardados para memória futura, sendo objectivo da associação promover o seu estudo. Trata-se de um património pouco valorizado mas muito presente um pouco por todo o país, como ficou bem expresso nas imagens com que João Cortiço finalizou a sua intervenção.
Aliás, esta foi uma das muitas questões levantadas durante as apresentações, que teve continuidade no período de debate que se seguiu. A forma depreciativa com que, muitas vezes, se olha para estes azulejos de produção industrial foi mesmo comparada ao modo como, no século XIX, se menosprezaram os azulejos de fachada. E deste tema rapidamente se chegou à questão da influência brasileira na azulejaria de fachada, um mito desconstruído por Francisco Queiroz, mas cujo debate aceso motivou a sugestão para um AzLab dedicado apenas ao azulejo de fachada, às suas origens e influências. O estudo dos mostruários e o confronto destes com os catálogos das fábricas foi outro dos aspectos discutidos, assim como a importância das marcas de tardoz. Por sua vez, o crescimento da colecção da Cortiço & Netos e os critérios de escolha para possíveis novas aquisições esteve também em foco, com João Cortiço a referir-se à ambição/sonho de poder, um dia, musealizar este imenso espólio.
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The AzLab Memories, Factories & Showcases had as guests Francisco Queiroz and João Cortiço, and was moderated by Patrícia Nóbrega. The session was initiated by Francisco Queiroz, who talked about the history of Santo António do Vale da Piedade Ceramic Factory and Devesas Ceramic Factory, both in Vila Nova de Gaia/Porto (he too mentioned the Viúva Lamego Factory, in Lisbon). Both factories presented many “applied showcases” of their patterned azulejos production in the factory buildings but also in their shops. These displayed to the customers the variety of patterns produced by the factories. However, the patterned applications in areas of limited access and visibility is an indication that this kind of showcases still poses many problems to the researchers, starting with the definition of showcase. The safeguarding of what remains of the factories and, consequently, its showcases, was also a shared concern, since its abandonment and easy access, as well as the difficulties regarding the classification of the remaining buildings, facilitates the theft of the azulejos within. In fact, during the following debate, the abandoned buildings of the Gaia factories and the need of its safeguard were concerns expressed in several interventions of the public.
João Cortiço presented the Cortiço & Netos collection, which started in the 1970s with his grandfather, Joaquim José Cortiço, who purchased azulejos from the factories and retailers. With a production chronology dating back to the second half of the 20th century, this collection witnesses the work of dozens of factories, counting up, at least for now, more than 900 different patterns. Through the AIAI – Associação para a Interpretação do Azulejo Industrial (Association for Industrial Tile Interpretation) -, copies of all these patterns are stored for future memory. To promote its study is one of the association’s objective. This kind of azulejos is little valued but very present all over the country, as was well expressed in the images with which João Cortiço ended his presentation.
As a matter of fact, this was one of many questions raised during both presentations, which continued in the debate period that followed. The derogatory manner that, often, the industrial azulejo production is looked at, was compared to the same manner as, in the 19th century, the facade azulejos were seen. And from this subject, quickly came the issue of the Brazilian influence on the facade azulejos, a myth deconstructed by Francisco Queiroz. The lively debate led to the suggestion for a AzLab dedicated exclusively to facade azulejo, to its origins and influences. The study of showcases and their confrontation with the factories catalogues was another discussed issue, as well as the importance of the factory marks on the back of each azulejo. In turn, the growth of the Cortiço & Netos collection and the criteria for potential new acquisitions was also in focus, with João Cortiço referring to the ambition / dream of being able to, one day, create a museum to display this vast heritage.